AGMP - Associação Goiana do Ministério Público -

NOTA TECNICA - PEC 53/2011 e PEC 75/2011

11/07/2013

Brasília, 11 de julho de 2013.
 
NOTA TÉCNICA

 

Referente à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 53, de 2011, do Senado Federal, que altera a redação do art. 93 da Constituição Federal, para excluir a aposentadoria por interesse público do rol de sanções aplicáveis aos magistrados, e à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 75, de 2011, que dá tratamento semelhante ao Ministério Público e retira-lhe a vitaliciedade.

 

A Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB, a Associação dos Juízes Federais do Brasil - Ajufe, a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho - Anamatra, o Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais - CNPG, a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público - Conamp, a Associação Nacional dos Procuradores da República - ANPR, a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho - ANPT, a Associação Nacional dos Ministério Público Militar - ANMPM e a Associação Nacional do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios - AMPDFT, entidades de classe de âmbito nacional da Magistratura e do Ministério Público cumprindo com os seus deveres institucionais e estatutários de colaborarem com o processo legislativo brasileiro, preservarem o Estado Democrático de Direito e resguardarem as salvaguardas do Poder Judiciário e do Ministério Público, apresentam a presente NOTA TÉCNICA pela APROVAÇÃO DO SUBSTITUTIVO DO SENADOR BLAIRO MAGGI, RELATOR DAS PEC´S NS. 53/2011 E 75/2011, e pela REJEIÇÃO DOS DESTAQUES, DAS EMENDAS DE PLENÁRIO E DE QUAISQUER SUBSTITUTIVOS ALTERNATIVOS, por vícios de inconstitucionalidade e/ou por inoportunidade e inconveniência político-legislativa, nos seguintes termos.

1. A PEC n. 53/2011, em sua redação original, prevê a abolição da pena de aposentadoria compulsória de magistrados e leva ao texto constitucional a figura da demissão, abrindo as portas para o fim da vitaliciedade da Magistratura. A PEC n. 75/2011, por sua vez, efetivamente extingue a garantia da vitaliciedade para os membros do Ministério Público, na medida em que autoriza a demissão administrativa aplicável diretamente pelo Conselho Nacional do Ministério Público. Atualmente, a perda definitiva do cargo de juiz ocorre apenas por sentença judicial com trânsito em julgado, nos termos do art. 95, I, da Constituição Federal, garantia da cidadania a que se denomina vitaliciedade; e igual garantia se aplica aos membros do Ministério Público, nos termos do art. 128, §5º, I, "a". Prevê-se para ambos, ademais, a pena de aposentadoria proporcional.

2. A vitaliciedade não foi conferida aos magistrados e aos membros do Ministério Público como privilégio pessoal ou proteção para evitar punições em casos de crimes ou faltas funcionais, mas sim como meio de assegurar a plena independência para o exercício de suas funções, colocando-os a salvo de pressões internas e externas que possam, de alguma forma, influenciar suas decisões (como a imunidade por opiniões, palavras e votos dos parlamentares). Com isso, ganham a democracia, o Estado de Direito e os cidadãos, com a segurança de que os processos, independentemente das partes e interesses envolvidos, serão julgados com imparcialidade e correção. Independência e autonomia são predicamentos imprescindíveis às carreiras constitucionalmente destacadas para enfrentar interesses políticos, econômicos e corporativas, além de decidir, inclusive, contramajoritariamente.

3. Esse entendimento foi já sufragado pelo Conselho Nacional de Justiça, órgão máximo de controle do Poder Judiciário, que emitiu a nota técnica n. 12 sobre o tema, onde assevera que,
"[l]onge de constituir privilégio pessoal, as garantias atualmente asseguradas no artigo 95, I da Constituição Brasileira (vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de subsídios) significam prerrogativa da instituição judiciária, visando assegurar ao magistrado a autonomia no exercício de sua atividade." (g.n.)

4. O próprio Supremo Tribunal Federal, ademais, e por mais de uma vez, já se manifestou sobre o tema, reconhecendo a natureza pétrea da vitaliciedade.

Veja-se:

"Sob esse prisma, ascende a discussão ao nível de um dos verdadeiros princípios fundamentais da Constituição, o dogma intangível da separação de poderes (CF, arts. 2° e 60, § 4°, III). Com efeito, é patente a imbricação e a independência do Judiciário e a garantia da vitaliciedade dos juízes. A vitaliciedade é penhor da independência do magistrado, a um só tempo, no âmbito da própria Justiça e externamente - no que se reflete sobre a independência do Poder que integra frente aos outros Poderes do Estado. Desse modo, a vitaliciedade do juiz integra o regime constitucional brasileiro de separação e independência dos poderes." (STF, ADI 98/MT, julg. 7/8/1997).

O último tópico da inicial impugna o disposto no art. 103-B, § 4º, inc. III, que, também introduzido pela Emenda Constitucional nº 45/2004, se ressentiria de inconstitucionalidade formal, uma vez que a expressão "perda do cargo", contida no texto vindo da Câmara dos Deputados, foi suprimida ao texto aprovado no Senado Federal. O argumento é de que a norma decotada deveria ser submetida à reapreciação da Câmara, em atenção ao art. 60, § 2º, da Constituição da República.

A Advocacia-Geral da União e a Procuradoria-Geral da República invocaram, com muita propriedade, precedentes da Corte que demonstram não padecer de inconstitucionalidade o dispositivo.

[...]

De todo modo, como reconhece a própria autora, a inclusão do poder de ordenar perda do cargo de magistrado vitalício, dentre as atribuições do Conselho Nacional de Justiça, essa é que poderia encher-se de vistosa inconstitucionalidade, perante o art. 95, inc. I, da Constituição da República, que restringe, taxativamente, as hipóteses em que pode dar-se a perda.

Nada valeria tornar a submeter a locução suprimida ao escrutínio da Câmara dos Deputados, se eventual norma resultante da aprovação estaria fadada a ser tida por inconstitucional, como bem alvitrou o parecer da PGR:

"... a supressão da expressão 'perda do cargo' não comprometeu a aprovação do remanescente, vale dizer, do conteúdo temático do texto normativo, posto que (sic), reconheceu-o a própria inicial, a expressão até então existente era 'flagrantemente inconstitucional', por indispor-se até mesmo ante a literalidade do artigo 95, I, parte final, da Constituição Federal, daí porque a supressão preserva o conjunto remanescente, para trilharmos o correto pensamento do Min. Octávio Gallotti" (fls. 194).(STF, ADI Nº 3.367, Relator Ministro CEZAR PELUSO).

5. No plano internacional, tais garantias são reconhecidamente ínsitas a todo e qualquer Estado Democrático de Direito, como já reconheceu a própria Assembleia Geral das Nações Unidas (Doc. ONU n. A/CONF.144/28/Rev.1 p. 118), nos chamados princípios da Bangalore (Princípios básicos relativos à Independência da Judicatura), que asseguram:

(a) o direito à não intromissão, no sentido de que "os juízes, como indivíduos, devem ter poder exclusivo para decidir sobre as causas que conhecem", livres ─ em conjunto ou individualmente ─ da ingerência indevida de particulares e também do Estado, seja na figura do Poder Executivo (negligenciando orçamentos ou tardando atos administrativos que acaso lhe caibam, como nomeações e reformas), seja na do Poder Legislativo (por meio de tráfico de influência ou edição de leis inconstitucionais), seja ainda na dos próprios tribunais de apelação ou superiores (que não podem interferir em causas judiciais antes que as mesmas, em grau de recurso ou por outra via de "procedural due process", cheguem ao seu regular conhecimento);

(b) as garantias institucionais da independência judicial, tendo em conta que "os Estados devem assegurar que existam salvaguardas estruturais e funcionais contra a ingerência política ou de outra índole na administração da justiça" (princípios ns. 01, 11, 12 e 13);

(c) a proteção funcional "interna corporis" e o correspondente direito a procedimentos administrativos justos (princípios ns. 17, 18, 19 e 20); e

(d) a imunidade pessoal dos juízes pelas decisões judiciais que proferirem (princípio n. 16).

Idênticos princípios aplicam-se, por iguais razões, aos membros do Ministério Público.

6. De outro turno, vitaliciedade não é sinônimo de impunidade. O juiz e o promotor/procurador corrupto ou delinquente deve e pode ser demitido no atual cenário jurídico. As associações signatárias apoiam textualmente a investigação meticulosa e a punição exemplar dos membros da Magistratura e do Ministério Público que se envolvem em atividades ilícitas ou criminosas.

Nesse encalço, vale lembrar que a atual legislação prevê, para aplicação da pena de perda de cargo, em ambos os casos, a condenação criminal por delitos graves e contra a Administração Pública (artigo 92 do Código Penal), a condenação civil por improbidade administrativa (Lei n. 8.429/1992) e, ainda, a condenação civil em ação civil específica de perda de cargo, que podem e devem ser propostas pelo Ministério Público ou pela Advocacia Pública.

7. Após intenso debate com todas as associações da Magistratura e do Ministério Público, de modo franco e aberto, o Senador BLAIRO MAGGI confeccionou substitutivo que reúne os tratamentos constitucionais alcançados pelas PECs ns. 53 e 75 e avança em um sentido claramente republicano, conducente a um regime disciplinar mais rigoroso para magistrados e promotores de todo o país. Nesse sentido,

(a) a pena de aposentadoria compulsória é restringida a hipóteses absolutamente residuais, impedindo-se a sua aplicação a crimes hediondos e equiparados e aos principais crimes de servidores públicos contra a Administração da Justiça (peculato em modalidade dolosa, corrupção ativa e passiva, concussão etc.);

(b) remanesce, portanto, apenas para os restritos casos em que o juiz ou promotor não é delinquente ou criminoso, mas tampouco tem condições de permanecer na carreira, não sendo tampouco o caso de se aposentar por invalidez;

(c) prevê-se a comunicação compulsória das condenações administrativas pelo reconhecimento de fatos definidos como ilícitos penais para os quais haja previsão de perda de cargo, com prazo de trinta dias para que o Ministério Público examine os elementos e ajuíze, se o caso, a competente ação civil de perda de cargo;

(d) esta nova ação civil para a perda do cargo terá regime de tramitação preferencial e admitirá, a critério do juiz natural, a suspensão cautelar das funções do juiz ou magistrado, por decisão do tribunal competente.
Esses todos são gravames novos, que hoje não existem, nesses termos, no regime jurídico-disciplinar acometido às carreiras da Magistratura e do Ministério Público. Permitirão que juízes e promotores sejam definitivamente afastados, de modo mais célere e eficaz, nos graves desvios de condutas.

Mas se preserva, por outro lado, a garantia da vitaliciedade, que é cláusula pétrea constitucional; e se assegura, de todo modo, a amplitude do direito de defesa a todo juiz ou promotor acusado, como deve ser, de resto, para todo e qualquer cidadão.

8. Todos os textos alternativos apresentados não possuem as mesmas qualidades. Ao antecipar efeitos jurídicos automáticos, antes do trânsito em julgado, ou ao permitir que os conselhos e tribunais representem ao Ministério Público "quando entenderem cabível a perda do cargo", sem qualquer especificação técnica, abre-se um cadafalso para a independência da Magistratura e do Ministério Público, que estarão absolutamente vulneráveis a desígnios políticos ou clamores demagógicos que venham a impregnar tribunais e conselhos, sem a garantia do juiz natural.

9. Por todas essas razões, as Associações abaixo subscritas pugnam pela aprovação integral do relatório e do substitutivo do Senador BLAIRO MAGGI para as PECs ns. 53 e 75/2011, e pela rejeição de quaisquer destaques, emendas ou textos alternativos. Para o bem da Democracia. Para a harmonia dos Poderes da República. E para o futuro de uma Magistratura e de um Ministério Público realmente independentes.

 

NELSON CALANDRA
Presidente da AMB

NINO TOLDO
Presidente da Ajufe

PAULO LUIZ SCHMIDT
Presidente da Anamatra

OSWALDO TRIGUEIRO
Presidente do CNPG

NORMA ANGÉLICA CAVALCANTI
Presidente da Conamp

ALEXANDRE CAMANHO DE ASSIS
Presidente da ANPR

CARLOS EDUARDO DE AZEVEDO LIMA
Presidente da ANPT

GIOVANNI RATTACASO
Presidente da ANMPM

ANTONIO MARCOS DEZAN
Presidente da AMPDFT

 

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